A busca pelo autoesquecimento para transformação do Ego
- Karla Peluci

- 8 de nov. de 2023
- 6 min de leitura

“ O evangelho, se for realmente aceito, remove a necessidade que você tem de ser respeitado, apreciado e bem visto o tempo todo; a necessidade que tudo na sua vida corra bem; a necessidade de ter poder sobre os outros.”
Quando li esta frase de Tim Keller, logo lembrei de alguns episódios que já me ocorreram até aqui, você também já deve ter passado por críticas, por julgamentos, já foi alvo de comentários, achismos infundados. E normalmente ficamos sabendo por terceiros, de pessoas próximas a nós, raramente ou quase nunca as pessoas tem coragem de tecer opiniões diretamente á quem faz um juízo.
Já sabemos que quando alguém fala sobre você diz mais à respeito de quem essa pessoa é do que sobre você.
Mas, e as emoções que nutrimos quando somos afetados por pessoas assim?
Raiva, rancor, indignação, repulsa, são alguns dos sentimentos que nos vem, afinal, somos humanos.
O que quero compartilhar hoje é sobre nossas ações diante das críticas e como precisamos reagir, não de modo carnal, mas sobre a luz do evangelho.
Ao que se refere?
O espírito ou o ego?
Em Mateus 26.41 nos mostra que o nosso espírito está pronto, Ele é o sopro de Deus, mas a nossa carne é fraca.
Então, á quem se fere diante de críticas e acusações? A nossa carne, ou seja, O EGO.
No livro do próprio autor Tim Keller, O Ego Transformado, ele nos ensina através das cartas de Paulo sobre como devemos transformar nosso senso de identidade através dos ensinamentos do Senhor. O livro todo se baseia na passagem de 1 Corintios 3.21-23 e 4. 1-7. Quanto ensinamento podemos aprender com Paulo nestes pequenos trechos à respeito do nosso ego e sobre como transformá-lo.
Paulo não busca nos coríntios nem em nenhum tribunal humano o veredicto para que ele se sinta que é alguém.
Paulo está dizendo aos coríntios que não se importa com o que pensam dele. Não leva em consideração o que as pessoas, sejam elas quem forem, achem dele. Na verdade, a identidade dele não deve nada ao que as pessoas dizem. É como se dissesse: "Não me importam o que vocês pensam, não me interessa a opinião das pessoas."
Leia:
"3.Mas para mim não tem a menor importância ser julgado por vocês ou por um tribunal humano. Eu não julgo nem a mim mesmo. 4.A minha consciência está limpa, mas isso não prova que sou, de fato, inocente. Quem me julga é o Senhor."
Paulo tem uma autovalorização e uma autoconsideração, e a sua identidade não está ligada a apreciação das pessoas.
Mas e sobre nós? Como alcançar este estágio de não nos importarmos com a opinião, críticas dos outros?
Muitos diriam que a resposta é obvia. Conselheiros afirmariam que não devemos levar em consideração o que outros pensam sobre nós. Na sociedade moderna que vivemos hoje, muito se ensina que existe uma fórmula para lidar com a baixa autoestima, que seria a autoestima elevada. Que a pessoa deve se enxergar de forma extraordinária, e de que ela precisa estabelecer seus próprios critérios e viver de acordo com eles.
Na abordagem de Paulo, tanto faz ele ser julgado, mas ele vai muito além, Paulo nem mesmo julga a si próprio. É como se ele dissesse: "Não me importo com o que vocês pensam, nem mesmo a minha opinião ao meu respeito." Ele tem uma consciência limpa e mesmo assim ele não vê diferença alguma nisto como esta no versículo 4. Ele sabe que uma consciência limpa não faz dele inocente.
Hitler talvez tivesse uma consciência limpa, mas isso não significa que ele era inocente.
Paulo encontra um senso que encontra em si mesmo, o senso de identidade.
Paulo foi um homem de estatura impressionante, muitos o colocam entre os seis líderes mais influentes da história. Ele tinha grande estabilidade, uma profunda influência e incrível confiança. Nada o inquietava e mesmo assim ele diz em 1 Timóteo 1.15: " Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores, dos quais eu sou o principal."
Resumindo: ele se coloca como o pior dos pecadores. Pois ele não diz "eu era" ele diz "eu sou o pior deles".
Não conseguimos ser assim, não estamos acostumados a sermos tão honestos com a gente mesmo como Paulo foi.
Tim Keller diz que não conseguimos, pois julgamos a nós mesmo. O ego de Paulo não está inflado...mas saciado. Paulo está nos ensinando sobre humildade, mas não qualquer humildade. O apóstolo alcançou um estágio no qual o ego não chama atenção para si, pois ele chegou num patamar em que não pensa mais em si mesmo.
No livro "Cristianismo puro e simples", C.S.Lewis faz uma observação brilhante sobre a humildade do evangelho. Depois que encontramos uma pessoas verdadeiramente humildes, não saímos da presença dela. Pessoas assim nunca afirmam que são insignificantes (quem vive dizendo isso é obcecado por si próprio), assim como o inverso também é verdade.
Depois que conversamos com alguém que tem a humildade do evangelho, o que impressiona é quanto essa pessoa se interessou por nós. Pois a essência da humildade do evangelho não é pensar em mim mesmo como se eu fosse mais, nem pensar em mim mesmo como se eu fosse menos. É simplesmente pensar menos em mim.
A humildade do evangelho mata a necessidade que tenho de pensar em mim. Não preciso mais ligar as coisas à minha pessoa. A humildade baseada no evangelho significa que não relaciono mais cada experiência e cada conversa à minha pessoa. Na verdade eu deixo de pensar em mim mesmo.
É a liberdade do autoesquecimento. É um descanso bendito que somente o autoesquecimento nos proporciona.
Portanto queridos leitores, a humildade verdadeira que brota do evangelho significa ter o ego satisfeito, não inflado.
Se trata de uma autoestima baixa? Não.
De uma autoestima elevada? Jamais.
Não tem nada a ver com autoestima. Paulo se recusa a entrar neste jogo que crescemos sendo doutrinados a acreditar.
Ele deixa muito claro: " Não me importo com sua opinião, mas também não me importo com a minha."
A pessoa verdadeiramente humilde não é aquela que se odeia ou se ama, e sim a que tem humildade do evangelho. Não imploram por atenção.
No livro sobre o Ego transformado, Keller nos ajuda a entender, através das cartas de Paulo à igreja de coríntios, que a pessoa que se esquece de si mesma não vai se sentir ferida, não vai ficar mal quando for criticada. A crítica não vai destruir seu dia, lhe tirar o sono. Por quê? Porque a pessoa que sente tudo isso valoriza demais a opinião e o que os outros pensam.
A pessoa que se esquece de si mesma age de forma diferente. Quem tem o ego satisfeito e não inflado não se deixa abater pelas críticas. A pessoa ouve e a entende como oportunidade. Idealismo isso? Não....quanto mais compreendemos o evangelho, maior é o nosso desejo de mudança.
Alcançar este estágio é extremamente difícil, falando por mim, é quase impossível. Mas sigo na busca de tentar ser como Paulo, como Jesus....pois é da nossa natureza buscarmos todos os dias aprovação, um veredicto que nos afirme que somos importantes, valiosos e reconhecidos. Isso nos coloca em julgamento, nos colocamos em um tribunal todos os dias.
A analogia que Paulo faz de um tribunal é magnífica, pois ali temos a acusação e a defesa, um dia podemos estar na posição de vencer, outros dias em posição de perder. No entanto Paulo descobre um segredo. O julgamento dele já está encerrado, um processo concluído no qual ele já deixou para trás.
Afirmando que quem o justifica é o Senhor, e não as pessoas, ou um tribunal, ou nem ele mesmo. Mas apenas o juíz dos juízes...nosso Deus.
Ele sabe que a opinião de Deus é a única que lhe importa e que ninguém mais poderá justificá-lo.
No cristianismo, o veredicto é que leva ao desempenho e não ao contrário. No cristianismo, no momento que decidimos crer, Deus nos afirma: "Este é o meu filho amado em quem Eu tenho prazer" (Mateus 3.17) . Em Romanos 8.1 - Paulo fala que agora nenhuma condenação há para os que estão em Cristo. Ou seja, assim que passamos a crer , Deus nos imputa ações perfeitas de Cristo e nos adota como filhos. O veredicto já foi anunciado. Então agora, Deus me ama e me aceita, não preciso fazer as coisas para ser aceito, para parecer bom. Tudo que faço é pela alegria de realizar, se ajudo as pessoas é porque de fato quero ajudar. Não com intuito de me sentir bem ou preencher vazios.
Termino fazendo um questionamento: Mas quem é amado e quem já foi aprovado por Deus precisa mesmo se apoiar no ego em busca de ser aceito e respeitado pelos outros?
Quanto mais caminharmos com Cristo, menos necessidade de aprovação e aceitação teremos. E assim conseguimos colocar o nosso ego em seu devido lugar, desenvolvendo nossa verdadeira identidade em Jesus Cristo.
Que nós possamos orar todos os dias pedindo ao nosso Pai que nos dê o necessário para desenvolver a humildade do evangelho e conquistar a liberdade que vem do autoesquecimento. Que Ele nos molde através das experiências ruins que fazem nosso ego se sobressair para que a essência Dele cresca em nós.
Lutar contra o próprio ego não é fácil, mas é o jeito de mantermos uma certa sanidade e paz de espírito. Martha Medeiros
Referências : Biblia versão NVI, Ego Transformado, a humildade que brota do evangelho e traz a verdadeira paz e alegria, Timothy Keller, editora Vida Nova @2012-2014




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